Nossas células precisam de energia para funcionar, tal energia vem da glicose e dos ácidos graxos (gordura). Sempre que há glicose disponível seu organismo a utiliza, quando a quantidade diminui drasticamente, ele passa a oxidar mais gordura em um estado NATURAL e fisiológico que chamamos de CETOSE.

Na cetose a gordura corporal é quebrada em corpos cetônicos, que são pequenas moléculas facilmente utilizadas pelos órgãos e tecidos. É possível identificá-las na urina (acetoacetato), no sangue (beta-hidroxibutirato – BHB) ou na respiração (acetona).

A capacidade de suprir as necessidades do organismo a partir de gordura corporal na falta de alimentos nos permitiu sobreviver ao longo de milhares de anos já que nem sempre a oferta de alimentos foi tão acessível. Tal capacidade também torna possível e seguro passar várias horas sem comer todos os dias durante o sono, por exemplo. Portanto frisemos: todos os dias, após várias horas de sono, todos nós acordamos em cetose LEVE.

Acontece, no entanto, que esse estado costuma ser confundido com o que conhecemos como CETOACIDOSE – uma condição aguda grave que ocorre exclusivamente em diabéticos tipo 1 (insulino-dependentes) descompensados.

Diferenciar os dois estados é bem fácil 👉na cetose a quantidade de BHB no sangue raramente ultrapassa 4mml/L (não é nada simples alcançar e manter isso) e não há nenhum tipo de sensação desagradável 👉na cetoacidose esse resultado geralmente encontra-se acima de 15-20mml/L e há a presença de sintomas como dor abdominal, vômito e confusão mental.

Se você não é diabético tipo 1, não há chances de entrar em cetoacidose. Nem mesmo se jejuar por muito tempo ou diminuir demais a quantidade de carboidratos da alimentação por um longo período (não que alguém precise fazer isso). Portanto precisa ficar para trás a ideia de que estar em cetose é algo perigoso que pode ocasionar danos a longo prazo.

Entendido isso, a pergunta é: precisamos estar em estado de cetose para emagrecer?

Principalmente alguns anos atrás, quando começava-se a ouvir mais sobre dietas baixas em carboidratos (não que sejam “novas” já que as primeiras comprovações datam do século 19), espalhou-se um boato de que se o sujeito estivesse em cetose, seu emagrecimento aconteceria mesmo se ele comesse quantidades enormes de carnes, queijos, creme de leite e outras fontes de proteína e gordura. Foi assim instalado o caos!

Pessoas (eu mesma) mediam seu nível de cetose usando fitas de cetona (urina ou sangue) e cuidavam para não sair do que se chamava de “zona ótima da quebra de gordura”. O que muitos não entendiam (também levei tempo para entender) é que quando dosamos a quantidade de BHB no sangue até é possível afirmar que a quebra de gordura está acontecendo, no entanto tal gordura pode não ser necessariamente a corporal, mas sim a proveniente da própria alimentação.

Quando não corretamente orientadas, pessoas que se dispõe a fazer uma dieta muito baixa em carboidratos acabam por aumentar exageradamente a quantidade de gordura que consomem. O problema disso é que, focadas no resultado da quantidade de corpos cetônicos observados no sangue, tais pessoas se esquecem do que REALMENTE FUNCIONA em termos emagrecimento 👉o DÉFICT CALÓRICO.

Dessa forma o sujeito pode muito bem manter-se em cetose e mesmo assim não emagrecer já que está extrapolando consideravelmente a quantidade de calorias ingeridas.
Uma dieta repleta de queijo, abacate, azeite, carne, ovo e creme de leite fica facilmente hipercalórica, daí o tiro no pé.

O que emagrece em uma dieta baixa em carboidratos NÃO É A CETOSE EM SI, mas sim o quadro 👉🏻 diminuição da liberação de insulina 👉🏻 consequente diminuição da fome 👉🏻 consequente diminuição do aporte calórico (tenho isso explicado em posts que fiz aqui em 2015).

Entendeu agora?
Mesmo em cetose, não há como ter um emagrecimento expressivo comendo MUITO mais calorias do que seu corpo precisa. E como sabemos disso?

Esqueça o baixo nível de evidência científica (opinião de especialista) e pense no que temos demonstrado em bons ensaios clínicos controlados.
Um dos que mais gosto para ilustrar o assunto é o “Calorie for Calorie, Dietary Fat Restriction Results in More Body Fat Loss than Carbohydrate Restriction in People with Obesity” publicado em 2015 na prestigiada Cell Metabolism.

Este ensaio clínico, que apesar de pequeno tem uma metodologia extremamente robusta (ambiente fechado, totalidade das refeições provida pelos pesquisadores e taxa metabólica basal medida por calorimetria indireta), deixa claro que uma dieta baixa em carboidratos NÃO produz um emagrecimento superior quando comparada a uma dieta baixa em gorduras (tenho ressalvas quanto a metodologia empregada nas dietas usadas para a análise – mas esse é um assunto para a galera da área).

A conclusão no entanto, não leva em consideração o fato de que as pessoas analisadas não estavam em condição de vida livre, ou seja, não podiam fazer escolhas ou comer apenas quando sentiam fome – o que é crucial uma vez que o real motivo de uma dieta baixa em carboidratos funcionar não é a diminuição do macronutriente em questão, a cetose, ou o aumento na ingestão de gordura, mas sim o modo como a estratégia afeta o fator COMPORTAMENTAL de quem a adere.

É o fato de que o sujeito nesse tipo de dieta experimenta a diminuição da fome, portanto deixa de comer a todo momento, e ainda troca pão por ovos, macarrão por peixe e biscoito por fruta.
É a mudança no padrão alimentar e comportamental que resulta no emagrecimento – e a eficácia DISSO já foi comprovada em MUITOS (mas muitos mesmo) bons ensaios clínicos conduzidos em condição de vida livre.

Então se seu objetivo é emagrecer e você se adapta bem a uma dieta baixa em carboidratos, faça. Mas livre-se da preocupação com a cetose e foque 100% em reconhecer suas sinalizações naturais de fome e saciedade, compor a base da sua alimentação de VEGETAIS (por sinal, hipocalóricos) e não cometer exagero no consumo de gordura afinal, infelizmente, em nutrição ainda não progredimos no quesito “milagre”, que segue não existindo.

Fonte: https://www.laranesteruk.com.br
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