O tempo de descanso entre séries é um dos fatores pouco conhecidos que podem afetar drasticamente o seu treino de musculação.
Mais que isso: também chamado de intervalo de recuperação (IR), esse tempinho que muitos usam para mexer no celular ou conversar é um divisor de águas entre um treino eficiente e um treino medíocre.
Como diria um velho ditado alemão:
E com a musculação não seria diferente.
Você certamente vê pouquíssimas pessoas contando o tempo entre séries, mas são justamente essas pessoas que obtêm os melhores resultados.
Tenha em mente algo valioso para todos os setores da sua vida: se você quer chegar onde ninguém chegou, você deve fazer o que ninguém fez.
No caso, quase ninguém.
E por isso tanta gente frequenta a academia durante anos e não tem os resultados esperados.
Então, continue lendo o artigo para entender melhor:
- Por que e como o tempo de descanso entre séries pode influenciar tanto os seus resultados;
- O intervalo de recuperação “ideal”, segundo alguns estudos, para cada tipo de treino (hipertrofia, força, resistência)
- O que fazer para turbinar seu descanso e realizar cada série como se estivesse começando o treino naquele momento (ou quase isso).
Por que o tempo de descanso entre séries pode mudar completamente seus resultados?
No artigo sobre como começar a malhar, eu falo que um dos itens essenciais para treinar é ter um relógio, de preferência digital.
Isso porque existem vários tipos de treino, e para cada um desses tipos, existe um tempo adequado de descanso entre as séries.
É muito que comum que as pessoas ignorem solenemente este tempo, como também é comum prescreverem 1 minuto de descanso como algo universal, que serve para qualquer pessoa e qualquer objetivo.
Porém, diferentes intervalos de recuperação modificam as respostas metabólicas, hormonais e cardiovasculares em um treinamento com pesos, assim como o desempenho das próximas séries.
Por meio do descanso entre séries, podemos regular os estímulos fisiológicos que desejamos obter.
Como exatamente isso acontece? (essa parte é a mais importante do artigo!)
Essa parte não é tão simples de entender, mas eu procurei ser o mais didática possível.
Se você entender isso, muitas outras dúvidas que você tem sobre musculação, aeróbico, ordem que você deve fazer os dois e etc. serão sanadas.
Então, leia com atenção.
O corpo humano dispõe de três vias metabólicas ou produtoras de energia:
- Sistema Anaeróbio Alático (ATP/CP – CP é creatina fosfato)
- Sistema Anaeróbio Lático (Glicolítico – Glicose e Glicogênio)
- Sistema Aeróbio (Oxidativo – Carboidratos e Gorduras)
Nenhum deles é usado isoladamente, mas, dependendo da duração e da intensidade da atividade, um deles se torna o principal.
Em movimentos de força e rapidez, como a musculação, o sistema anaeróbico alático (ATP/CP) é o mais utilizado, pelo menos em um primeiro momento.
ATP, que é trifosfato de adenosina ou adenosina trifosfato, são moléculas armazenadoras de energia.
Numa série de reações químicas, estas moléculas se transformam em energia e funcionam como “bateriazinhas”, que poderão liberar “doses” de energia nos locais onde estiverem.
Elas são a principal fonte de energia de dentro das células para os tecidos corporais e por isso toda contração muscular e produção de força devem-se a esta molécula.
Porém, os estoques de ATP nas células são pequenos e precisam ser ressintetizados a partir de outros substratos, como a creatina (ATP-CP), glicose e lipídios (gordura).
Do início da série de musculação até o 10º segundo (intensidade alta) ou até 20º segundo (intensidade moderada) a creatina atende a demanda da síntese de ATP.
Depois disso, a síntese de ATP passa ser realizada pela glicose, sem a presença de oxigênio. Após terminar a série, o músculo precisa de tempo para recuperar os níveis iniciais de ATP.
E é aí que entra o tempo de descanso entre séries!
Alguns autores, como Bompa, afirmam que quando o objetivo é hipertrofiar os músculos, o treino deve ser planejado de maneira que as reservas energéticas (ATP-CP) sejam esgotadas.
A finalidade disso é comprometer a quantidade de energia disponível para o músculo exercitado, e uma das maneiras de se atingir este objetivo é reduzindo os intervalos de descanso entre as séries.
O argumento usado é que quando o intervalo de recuperação é mais curto, o músculo tem menos tempo para restaurar as reservas energéticas ATP-CP.
Se a série for até a exaustão ou chegar bem perto disso, as reservas de ATP-CP serão consumidas e o curto intervalo de descanso não proporciona a recuperação completa dessas reservas.
Assim, o músculo é forçado a se adaptar, aumentando a sua capacidade de transporte de energia, o que resulta no estímulo ao crescimento muscular.
Isso acontece graças ao aumento da quantidade de creatina fosfato (CP) nas células musculares e à ativação do metabolismo protéico, fatores que, por sua vez, estimulam a hipertrofia.
Então a musculação não emagrece, porque ela não usa gordura como fonte de energia, certo?
Errado, erradíssimo!
Existem inúmeras discussões energéticas no treinamento que se confundem com métodos de treino.
Essas divisões de sistema energético são meramente didáticas.
A musculação é uma atividade anaeróbia, mas a sua recuperação é aeróbica, isto é, usa glicose e gorduras como fonte de energia. É neste sistema que as fibras se restabelecem.
Inclusive, não só a recuperação pós-treino é aeróbia. A recuperação intra exercício e inter sets também pode ser, dependendo do tempo de descanso (olha ele aí de novo).
Neste artigo, eu explico por que musculação emagrece (e ajuda você a se manter magra) e um dos motivos é justamente esse.
A musculação em si pode até não gastar tantas calorias quanto uma corrida, mas a recuperação do treino de musculação exige muito mais do nosso corpo e por isso queima mais calorias no total.
Quanto maior for a intensidade do exercício, maior será a demanda de energia para reparar o que foi gasto pelo corpo.
Além disso, treinos com peso desencadeiam modificações hormonais, como aumento dos níveis de testosterona e gh e aumento da sensibilidade à insulina, o que favorece o emagrecimento.
Como explico neste artigo, gasto calórico não deve ser seu foco, inclusive (e especialmente) quando seu objetivo é emagrecer e se manter magra. Foque em hormônios.
» Leia também: HIIT e Musculação: A combinação perfeita para combater flacidez, celulite e gordura localizada
Descanso diferente para objetivos diferentes
Cada pessoa tem uma capacidade de regeneração muscular e de recuperação dos substratos energéticos (ATP/CP).
Por isso, é impossível determinar um tempo ideal de descanso que sirva para todos e que se encaixe em qualquer objetivo.
Mas, o que alguns estudos sugerem é que:
- Intervalos de 30 segundos promovem 60% de recuperação de ATP/CP;
- 60 segundos recuperam 70% dos níveis iniciais de ATP;
- 90 segundos recuperam 80% dos níveis iniciais de ATP;
- 2 a 3 minutos recuperam 90% dos estoques energéticos;
- 5 minutos recuperam 100% da creatina fosfato
Você deve procurar ter uma breve noção sobre o assunto e, junto a um bom professor, encontrar um tempo de intervalo que seja adequado ao seu objetivo e experiência de treino, além de unir isso à sua disponibilidade de tempo para treinar.
Veja a seguir os intervalos de recuperação que normalmente são usados para cada tipo de treino.
Lembrando que, mesmo que seu objetivo seja hipertrofiar (ganhar massa magra), é interessante fazer outros tipos de treino, dentro de uma periodização de treinamento. Assim você evita a estagnação dos resultados.
Hipertrofia
Alguns autores afirmam que um intervalo diminuído entre as séries, isto é, de 40 a 90 segundos, talvez seja o componente mais importante de um treino que visa hipertrofia muscular.
Neste tipo de treino, deve-se fazer com que o músculo recrute a maior quantidade possível de unidades motoras, e isto se faz exaurindo suas reservas de ATP-CP.
Com esse intervalo curto entre as séries, o objetivo é que a pessoa realmente não consiga fazer o mesmo número de repetições do começo ao fim da série, mas que treine até a sua falha (falha é o momento que você não consegue fazer mais nenhuma repetição, pelo menos não sem ajuda).
Assim, o músculo é forçado a se adaptar e aumentar sua capacidade de transporte de energia.
Força muscular
Quando o objetivo principal do treino é aumentar a força muscular, é primordial que as séries tenham um baixo número de repetições, para que o praticante consiga trabalhar com uma carga elevada.
Além disso, o tempo de intervalo entre séries deve ser o suficiente para que, ao longo do programa, seja possível executar as séries sem ter uma queda abrupta no número de repetições.
Seria algo entre 2 e 5 minutos, mas isso depende da carga utilizada e do grupamento que será treinado.
Resistência muscular
Neste caso, os intervalos não devem passar de 30 segundos, já que o objetivo é não parar de realizar movimento.
A continuidade faz com que haja uma adaptação dos músculos, tornando-os capazes de suportar uma carga de leve a moderada por um espaço maior de tempo.
Treinamentos em circuito entram neste sistema.
Importante: Músculos diferentes, descansos diferentes
Estes intervalos de descanso são um parâmetro, mas é importante ter em mente que músculos menores precisam de um descanso menor.
Exercícios isoladores, como rosca bíceps ou cadeira adutora, não sobrecarregam o sistema nervoso e não demandam tanta energia.
Por outro lado, uma série de agachamentos ou afundo precisa de um intervalo de recuperação maior, pois o exercício exige muito mais do sistema neuro-muscular.
Então, além de prestar atenção aos intervalos descritos acima, você deve ouvir o seu corpo.
Se você consegue fazer a série muito antes do tempo prescrito, deve tornar o exercício mais intenso, geralmente aumentando a carga.
Se você nunca consegue fazer a próxima série no descanso recomendado e sempre precisa descansar mais, talvez precise diminuir um pouco a carga. E, já que o tempo de descanso será menor, isso não afetará a intensidade do exercício.
» Leia também: Treino HIIT: Como fazer? | Os 3 protocolos mais conhecidos (+ o que eu faço)
4 Dicas para aproveitar o seu descanso entre séries e ter um Treino Poderoso
Imprevistos podem acontecer a qualquer momento, é verdade. Mas, sejamos sinceras, você não tem que ficar 100% disponível para “imprevistos” justamente na hora do treino de musculação.
Para mim, quem não coloca o celular no silencioso na hora de malhar, simplesmente não está a fim de levar o treino a sério. (óbvio que existem situações excepcionais, mas via de regra é isso mesmo)
E se for o caso, para que ficar perdendo tempo e energia na academia?
Mas… Para você que deseja treinar sério e obter resultados ainda melhores, aí vão algumas dicas matadoras:
– Dica #1: Aproveite o tempo de descanso para respirar: uma respiração correta pode melhorar consideravelmente seu rendimento nos treinos.
Sendo assim, evite falar durante o exercício em si (não sei como tem gente que consegue) e no intervalo de recuperação, já que isso atrapalha a respiração e, consequentemente, o desempenho.
A verdade é que, se você treina de forma intensa, não consegue fazer outra coisa que não seja respirar e tentar aproveitar seu descanso da melhor forma possível.
– Dica #2: Tenha atenção no intervalo entre exercícios: o intervalo entre exercícios também influencia, e muito, na intensidade geral do treino e deve ser tratado com a mesma seriedade que o intervalo entre as séries.
Se o aparelho que você vai fazer está ocupado e não tem como revezar, não fique ali esperando sem fazer nada. Vá para o próximo exercício ou volte para o que você estava fazendo e realize mais algumas séries (mais leve, apenas para o músculo não esfriar)
– Dica #3: Escolha um momento adequado para uma pausa: se tiver que parar por algum motivo (fazer xixi, por exemplo), pare entre um grupamento e outro.
Por exemplo: se você malha tríceps e bíceps no mesmo dia, vá ao banheiro depois que terminar todos os exercícios de um desses grupamentos.
Se tiver que parar o treino em um outro momento, e assim acabar descansando mais do que deveria, inicie novamente o exercício como se estivesse fazendo a primeira série.
– Dica #4: Volte sua mente para o seu treino e para o seu corpo: a experiência é o que permite a você descobrir se seu corpo trabalha melhor com intervalos mais longos ou mais curtos.
O único erro quando o assunto é tempo de descanso é dar intervalos longos demais. Então, evite a todo custo dar descansos que façam você perder o foco e a intensidade do treino.
Conclusão
Eu confesso: sou bem espartana quando o assunto é treino. Em relação ao tempo de descanso, sou muito exigente comigo mesma.
Para mim, cada segundo conta, e eu até prefiro fazer outro exercício do que revezar com alguém, e assim acabar tendo um descanso maior que o necessário.
Claro, você não precisa ser neurótica(o), mas precisa entender que essa é uma variável muito importante do treino, talvez a mais importante.
É esse intervalo de recuperação que determina o número de repetições que você conseguirá fazer, assim como o peso e até a qualidade do movimento.
Comer sua batata doce no pré-treino, tomar suplementos, treinar na academia mais legal do seu bairro… Nada disso adianta se você não tiver foco no seu treino.
Concentre-se no que você está fazendo. Sinta cada repetição. Procure se observar fazendo os exercícios. Tente melhorar um pouco a cada série. Fique presente.
Treinar é muito mais que fazer uma série que alguém passou para você. É sentir seu corpo e sua mente evoluírem a cada treino.
Disciplina, autocontrole, motivação, força de vontade, autoconfiança… Os benefícios da prática da musculação (e de qualquer atividade física) são muitos e transbordam para todos os âmbitos da sua vida.
Portanto, pratique! E pratique da melhor forma possível.
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Fontes:
- http://www.treinomestre.com.br/qual-o-tempo-ideal-entre-repeticoes/
- http://dicasdemusculacao.org/tempo-descanso-entre-series-pode-influenciar-crescimento-muscular/
- http://www.cdof.com.br/musc20.htm
- http://www.efdeportes.com/efd188/intervalo-entre-series-de-musculacao.htm
- http://www.hipertrofia.org/blog/2015/09/04/quanto-tempo-descansar-entre-as-series-e-exercicios/
- http://www.scielo.br/pdf/rbme/v14n3/a02v14n3.pdf
- http://www.kleberpersonal.com.br/dicas/dica134.doc