Já expliquei muitas outras vezes sobre a importância de dominar um pouco de metodologia da pesquisa científica a fim de avaliar evidências com mais propriedade.
Quem acompanhou esse papo (tanto aqui como em uma palestra minha), sabe o peso de uma metánalise de ensaios clínicos randomizados e controlados! Esta, publicada este ano, é um exemplo disso!
O objetivo era avaliar o efeito da substituição da ingestão de gordura saturada (leia-se: gordura de carne, queijo amarelo, manteiga) por gordura poli-insaturada (principalmente óleos vegetais) na ocorrência de doença coronariana e morte por esta e todas as causas.
O resultado corrobora o das outras oito metanalises que já postei por aqui: engana-se quem acha que trocar banha de porco (ou manteiga, ou oleo de coco) por óleo de soja (ou milho, ou girassol, ou canola) vá reduzir o risco de um evento cardiovascular, morte por doença cardiovascular ou mortalidade total!
Para nós isso não é novidade, mas um ponto interessante é na verdade o modo como os autores pontuaram que resultados na contra-mão disso (sugerindo benefícios dessa troca) se devem ao fato de que ensaios clínicos “inadequados” foram considerados!
Na segunda foto coloquei um dos trechos que trata disso (ESTA SEGUNDA IMAGEM PRECISA VIR AQUI). O estudo chama atenção para a importância dessas afirmações no que diz respeito as atuais Diretrizes Alimentares, que se considerassem a totalidade da evidência (como o próprio projeto Diretrizes sugere) e se baseasse em nível 1 e 2 (também o sugerido pelo projeto) estariam sujeitas à uma guinada no rumo das orientações no que diz respeito à saúde cardiovascular
Aos profissionais da saúde: a leitura dessa é OBRIGATÓRIA!
Nas últimas semanas, a manchete “GORDURA DO OLEO DE COCO FAZ TÃO MAL QUANTO A GORDURA DA CARNE E DA MANTEIGA” gerou polêmica.
A afirmação circulou em sites por todo lado e causou frisson! Com razão!
Dr. Souto, dono do blog “Ciência Low Carb” publicou um belíssimo texto a respeito, texto este que resumi a seguir:
A AHA (Associação Americana de Cardiologia) publicou um artigo atacando a gordura saturada da dieta, o que causou um movimento repleto de manchetes errôneas e fantasiosas!
Não se trata de um novo experimento ou de uma nova revisão sistemática. Trata-se de uma revisão narrativa, isto é, seus autores claramente partiram da conclusão “gordura saturada faz mal”, e selecionaram apenas os estudos que corroboram essa visão, ignorado os que a contradizem, (ignoraram ensaios clínicos dos mais importantes, incluindo o Sydney Diet Heart Study, o Minnesota Coronary Experiment e o Women’s Health Initiative) e incluíram QUATRO estudos antigos, mas que corroboravam seu ponto de vista. Chamaram isso de “totalidade das evidências”, o que foi embaraçoso já que existem 3 metanálises e 3 revisões sistemáticas de estudos observacionais que não encontraram associação entre gordura saturada e doença cardiovascular MAIS 6 metanálises e 5 revisões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados, e NENHUMA delas encontrou efeito de gorduras saturadas em mortalidade total ou mortalidade cardiovascular. (As referências de todos estes estudos você encontra no post original – e a maioria já foi postada aqui também)
É interessante notar que o próprio artigo da AHA afirma que não adianta substituir gorduras (saturadas ou não) por carboidrato. Ou seja, eles não questionaram a estratégia Low Carb, já que comer BAIXO em carboidratos não tem absolutamente NADA A VER com comer ALTO em gordura, são coisas independentes que podem ou não ser combinadas.
O que continua claro pra nós é que a AHA não é favorável à pirâmide alimentar, na qual as gorduras são substituídas por carboidratos, pois esta é CLARAMENTE uma opção ruim (considerando a totalidade da evidência disponível em 2017).
O mesmo artigo deixa CLARO também que a AHA já abandonou a ideia de que restringir gorduras totais na dieta seja útil ou desejável (no post original é possível ver as declarações por escrito).
Então vamos entender: a AHA não está condenando dietas baixas em carboidratos e NEM DE LONGE está recomendando uma dieta Low Fat (baixa em gordura), ela inclusive posiciona-se CONTRA um limite, percentual ou absoluto, na quantidade de gordura na dieta (leia de novo: ELA (AHA), não eu).
A AHA afirma que reduzir a quantidade de gordura saturada NÃO traz benefício SE isso for compensado pelo aumento de carboidratos, ou seja, uma dieta alta em carboidratos é, na visão da AHA, tão ruim quanto uma dieta rica em gordura saturada!
A ÚNICA questão em discussão aqui é, se em uma dieta low carb, a gordura saturada deve ser limitada ou não. MAIS NADA!
Então se você entendeu isso, concluiu facilmente que o artigo de revisão da AHA não era sobre óleo de coco. Ele apenas foi citado salientando que era uma gordura saturada. E, no raciocínio dos autores, se é saturado, é ruim.
É muito possível que movidos pela irritação com tanto modismo em relação a esse assunto (E nisso eles tem toda razão), mas nunca houve um ensaio clínico randomizado com óleo de coco e desfechos duros, concretos (mortes). Isso não mudou. Não há NADA de novo, do ponto de vista científico sobre óleo de coco.
No próprio artigo a AHA admite que óleo de coco, no contexto de uma dieta baixa em carboidratos, ajuda a MELHORAR o perfil lipídico, ao reduzir a relação LDL/HDL. Em seguida, eles embarcam numa discussão na qual confundem o fato de que elevações medicamentosas e genéticas de HDL não reduzem doença cardiovascular com o fato conhecido de que uma relação LDL/HDL mais baixa em razão de estilo de vida é um fator de risco (reduzido) muito mais importante do que o LDL isoladamente.
Se você leu até aqui (em primeiro lugar: PARABENS) entendeu que essa polêmica não passou de mais um caso de sensacionalismo misturado a dificuldade em interpretação de texto, regada a desconhecimento sobre metodologia da pesquisa científica. Não foi uma nova descoberta. Não é um novo ensaio clínico randomizado. Nem mesmo uma metanálise sobre óleo de coco. É apenas um parágrafo dentro de uma revisão narrativa, na qual os autores admitem que o perfil lipídico melhora com óleo de coco (LDL/HDL), então explicam que HDL não lhes interessa, e que o aumento do LDL é motivo aconselhar que se evite o seu uso.
O problema é sempre o mesmo: as pessoas não se preocupam em entender a veracidade da informação jogada na mídia. Não têm interesse no que não seja fácil ao extremo. Muitos não são capazes nem mesmo de ler o que já está mastigado (como no caso destes posts aqui)!
Então vamos mastigar mais um pouquinho:
Não, cozinhar com óleo de coco NÃO faz mal (e nem com manteiga, e nem a gordura da carne faz mal)!
O problema sempre estará no excesso! Na falta de bom senso!
Comer uma dieta baixa em carboidratos não significa comer muita gordura!
A AHA (American Heart Association) não apoia uma dieta rica em carboidratos (como sugere o esquema da pirâmide alimentar).
É necessário cuidado para avaliar as informações e sempre considerar a TOTALIDADE das evidências.